Mpox – VARÍOLA DOS MACACOS: Atualização 2024

Mpox – VARÍOLA DOS MACACOS: Atualização 2024

Tempo de leitura: 28 minutos

A Mpox é uma zoonose viral causada pelo Monkeypox virus (MPXV), da família Poxviridae, capaz de infectar diferentes espécies de mamíferos. É uma doença transmissível, autolimitada e caracterizada pelo surgimento de pústulas na pele dos indivíduos infectados.

Existem 2 doenças causadas por vírus pertencentes a mesma família de vírus: Monkeypox vírus, (MPXV – do inglês monkeypox), que causa a doença antigamente chamada de Varíola dos Macacos, hoje Mpox e o Varíola vírus (VARV – do inglês smallpox), causando a doença chamada de Vavaríola ou Varíola Huimana. Ambos os vírus pertencerem à mesma família, Poxviridae, causando doenças que se manifestam de forma semelhante clinicamente, embora a Mpox seja menos grave que a Varíola.

Varíola Humana

A varíola foi introduzida no Brasil pelos colonos franceses em 1555, no estado do Maranhão. A doença foi se disseminando durante o processo de colonização, com surtos em 1560 e 1562-63. A primeira referência à varíola no Brasil foi feita por José de Anchieta em 1561, e a primeira epidemia registrada foi em 1563, na Bahia. A vacina chegou ao Brasil em 1804.

Em 1971, foram notificados 19 casos de varíola no Brasil, todos no estado do Rio de Janeiro. O último caso da doença foi em abril de 1971, em 19 moradores da Vila Cruzeiro, uma comunidade de baixa renda no bairro da Penha, na zona norte da cidade do Rio de Janeiro.

O Brasil foi o último país das Américas a erradicar a varíola. Em 1971 foram notificados 19 casos, sendo que em 1972 ocorreu o último caso da doença em nosso meio, considerada, a partir de então, erradicada do continente americano.

A Organização Mundial de Saúde (OMS) considerou a varíola como a única doença totalmente erradicada por conta da vacinação no Brasil em 1980. No entanto, atualmente, considera-se importante estar preparado para responder a um possível ataque com o vírus da varíola, como arma biológica, por se saber que este agente é relativamente estável, de fácil disseminação e de alta transmissibilidade.

Mpox

O MPXV foi identificado na década de 50, entretanto o primeiro caso em seres humanos foi observado em 1970. Vale ressaltar que embora a descoberta do vírus tenha ocorrido em macacos em um laboratório dinamarquês em 1958, a Organização Mundial da Saúde (OMS) considera inadequada a nomeação dada à doença, esclarecendo que a maioria dos animais suscetíveis a esse tipo de varíola são roedores, como ratos e cães-da-pradaria.

A transmissão da Mpox a humanos pode ocorrer por:

  • Contato próximo com lesões cutâneas, secreções respiratórias ou objetos recentemente contaminados;
  • Contato prolongado, face a face, com secreções respiratórias;
  • Via vertical (transplacentária ou contato próximo entre a mãe e o bebê durante e após o parto).

Outras formas de transmissão entre seres humanos, incluindo por contato sexual, estão sendo estudadas.

No caso da transmissão entre animais temos:

  • De animais infectados para outras espécies, incluindo humanos (contato direto com sangue, outros fluidos corporais e/ou lesões do animal infectado), e de humanos para animais.

Nas regiões endêmicas, a taxa de letalidade (TL) varia de 3,6% a 10,6% e, em geral, tanto as manifestações da doença quanto a TL são piores nos pacientes imunossuprimidos, como os pacientes que vivem com o vírus da imunodeficiência humana (HIV).

Entre 1981 e maio de 2022, a maior parte dos casos no mundo ocorreu na África Central, com mortalidade de 10% em indivíduos não vacinados contra varíola.

Fonte: CDC – U.S. CENTERS FOR DISEASE CONTROL AND PREVENTION. Mpox 2022-2023 Mpox Outbreak Global Map. Disponível em: https://www.cdc.gov/poxvirus/mpox/response/2022/world-map.html.

O surto de Mpox atingiu muitos países em todo o mundo. A partir de maio de 2022, houve uma transmissão mais abrangente do vírus, uma distribuição geográfica mais ampla de casos e casos com sinais e sintomas diferentes dos casos endêmicos da África.

O primeiro caso identificado de Mpox foi em 6 de maio de 2022 no Reino Unido e até 28 de dezembro de 2022 foram confirmados no mundo – em 110 países – 83.539 casos de Mpox, com 74 mortes distribuídas em 18 países.

Até o dia 30 de dezembro de 2022 – Semana Epidemiológica 52 (SE 52), 10.511 casos de Mpox foram confirmados no Brasil, a grande maioria dos casos se concentram nos estados da região sudeste, como pode ser observado no gráfico.

Fonte: Ministério da Saúde

O último boletim epidemiológico sobre casos de Mpox no Brasil, data de julho de 2023, conforme imagem abaixo:

Fonte: Ministério da Saúde

Monkeypox virus, assim como os outros membros da família Poxviridae, tem genoma composto por DNA de fita dupla, que é replicado no citoplasma da célula hospedeira. O material genético tem aproximadamente 197 kilobases (kb) com 190 genes. Eles têm morfologia ovoide ou semelhante a tijolos e são envolvidos por envelope lipoproteico. Apesar de serem observados apenas por microscopia eletrônica, são considerados de grande porte, uma vez que seu tamanho pode variar de 200 a 250 nanômetros (nm).

Uma característica interessante do MPXV é que ele apresenta duas formas infecciosas: vírion maduro (VM) e vírion envelopado (VE). A diferença é baseada na quantidade de camadas de membranas que o envolvem. As partículas VMs são caracterizadas pela presença de apenas uma membrana externa, enquanto os VEs têm a membrana externa e mais uma membrana também chamada de envelope, que é derivada da célula hospedeira. As proteínas da membrana externa dos VMs desempenham importantes funções relacionadas à entrada na célula hospedeira e subsequente patogênese. De forma simplificada, o VM é aquele vírus sem o envelope externo e o VE é um VM que tem o envelope viral.

Fonte: Instituto Oswaldo Cruz (IOC/Fiocruz)

Diferentemente dos vírus com genoma de RNA, os vírus de DNA geralmente apresentam poucas mutações. No entanto, as amostras de MPXV isoladas do surto de 2022 parecem ter muitas mutações. Foram identificadas cerca de 40 mutações que os diferem da linhagem mais próxima, que é de 2017, sugerindo um processo evolutivo que pode estar associado à disseminação com maior eficiência, o que explica a maior transmissibilidade (KUMAR et al., 2022).

Acredita-se que a habilidade dos poxvírus de se tornarem restritos aos hospedeiros seja devido tanto à transferência e acúmulo de genes de escape do sistema imunológico do hospedeiro como à coevolução dos vírus e de seus hospedeiros ao longo dos anos. Além disso, o tropismo tecidual afeta a distribuição e a propagação do vírus em hospedeiros infectados e entre os hospedeiros saudáveis.

De acordo com sua estrutura genômica, historicamente o MPXV foi classificado em dois clados, ou seja, dois vírus diferentes com um ancestral em comum, denominados clados “África Ocidental” e “África Central”, também conhecido por “Bacia do Congo”, que convivem na região entre Camarões e República Democrática do Congo. 

Devido à necessidade de alterar tanto o nome da doença quanto do vírus, que já foi citada anteriormente, o grupo de especialistas convocados pela OMS concordou em alterar o nome das variantes do ortopoxvirus que causam a mpox tanto para minimizar ofensas a grupos sociais, culturais, nacionais, regionais, profissionais ou étnicos como para mitigar as repercussões negativas desses nomes no comércio, viagens, turismo e bem-estar animal.

Sendo assim, os clados Bacia do Congo e África Ocidental passariam a ser denominados clado um (I) e clado dois (II), respectivamente. O clado II ainda tem dois subclados, clado IIa e clado IIb. Esses clados representam a diversidade genética acumulada ao longo de muitos anos de evolução no reservatório animal e incluem a maioria dos isolados ligados a surtos na República Democrática do Congo. Esses clados, que são responsáveis pela maioria dos ciclos naturais de transmissão e das manifestações endêmicas na África, têm transmissão diferente e padrões patobiológicos e manifestações clínicas distintas, evidenciando as diferenças entre eles.

Os clados I e II têm diferenças de 0,5% na sequência genômica e estão associados a apresentações clínicas diferentes da doença. O clado I é clinicamente mais grave, portanto, está associado a maiores taxas de mortalidade e maior transmissibilidade, quando comparado ao clado II.

No Brasil, o padrão genético do vírus é semelhante ao observado em outras partes do mundo. Além disso, as amostras identificadas estavam intimamente relacionadas com as amostras sequenciadas em Portugal, Alemanha, Espanha e EUA.

Hospedeiros Animais e Ciclo de Transmissão da Mpox

Embora o reservatório definitivo do MPXV ainda não tenha sido completamente identificado, infecções espontâneas foram descritas em diversas espécies de mamíferos, e vírions viáveis foram encontrados em diferentes tecidos de animais que morreram em decorrência da infecção. Suspeita-se ainda que roedores que vivem na África desempenham um papel fundamental na transmissão da infecção.

Observe que o MPXV pode atravessar a placenta, ou seja, a transmissão da mãe infectada para o feto também deve ser considerada. Outras formas de contágio são pelo contato direto com a lesão e com fluidos corporais ou pelo contato indireto com objetos contaminados, como roupas e lençóis. Ainda não está confirmada a transmissão sexual. Embora o vírus já tenha sido encontrado no sêmen, são necessários mais estudos confirmatórios.

Por ser um vírus zoonótico (termo utilizado para classificar as doenças que são transmitidas de maneira natural entre os animais e os seres humanos), a maior parte das infecções humanas em áreas endêmicas acontece em áreas rurais e associadas aos reservatórios animais.

Importante: O Macaco é um hospedeiro acidental, assim como o homem, para o monkeypox vírus.

Ciclo de transmissão do MPXV começa a partir de: (1) de roedores a macacos; (2) de macacos a humanos; (3) de roedores a humanos; (4) de pessoa infectada a pessoas saudáveis por meio de gotículas respiratórias; (5) de pessoa infectada a pessoas saudáveis pelo contato direto com a lesão

Fonte: Ministério da Saúde

É importante lembrar que o MPXV já foi identificado em uma grande variedade de animais diferentes. Muitos desses animais infectados são caçados para alimentação, tornando-os fonte de infecção para os humanos. Alguns animais têm distribuição restrita a algumas regiões, enquanto outros são amplamente distribuídos. Dessa forma, é possível que, nas regiões onde existem os dois clados do vírus (I, IIa e IIb), as barreiras geográficas podem ser oportunidades ecológicas de infecção e de adaptação a diferentes hospedeiros para o vírus.

É possível também que alterações climáticas e ecológicas tenham causado epizootias (ocorrência de um determinado evento em um número de animais ao mesmo tempo e na mesma região, podendo levar ou não à morte) em roedores na África Ocidental e Central nos últimos anos, com consequente aumento da transmissão do MPXV a humanos e primatas não humanos. A invasão de habitats selvagens pode favorecer a interação entre animal e homem, criando oportunidades de transbordamento da cadeia de transmissão, e a variabilidade genética encontrada nos isolados do surto de 2022 demonstra que também ocorreu uma grande mudança biológica do vírus.

Alguns dos animais que agem como reservatórios ou hospedeiros:

Roedores: Diversas espécies de roedores são consideradas os principais reservatórios naturais do vírus. Isso inclui:

  • Esquilos
  • Ratos africanos gigantes (Cricetomys spp.)
  • Ratos listrados (Hybomys spp.)
  • Ratos do gênero Graphiurus

Primatas não humanos: Macacos e outros primatas não humanos podem ser infectados pelo vírus e agir como hospedeiros, o que foi uma das razões pela qual a doença foi inicialmente chamada de “monkeypox”.

Outros mamíferos: Alguns outros pequenos mamíferos, como o gambá, também têm sido identificados como potenciais hospedeiros do vírus.

Grupos Vulneráveis

Os casos de Mpox descritos em países africanos antes de 2022 afetavam igualmente homens e mulheres, sendo mais frequentes em menores de 40 a 50 anos e não vacinados contra a varíola.

Desde o início do atual surto, observa-se que a população mais afetada são os homens, que respondem por 97,5% dos casos relatados nos EUA entre maio e setembro de 2022, com idade média de 34 anos. Um levantamento dos casos em 16 países realizado de abril a junho de 2022 identificou 528 casos confirmados, dos quais 527 eram homens, com idade média de 28 anos. O mesmo perfil demográfico é observado em outros países, inclusive no Brasil. No estado do Rio de Janeiro, por exemplo, dos 1.153 casos confirmados até 24 de outubro do mesmo ano, 837 tinham entre 20 e 29 anos e 92,5% tiveram o sexo masculino atribuído ao nascimento 

Observou-se ainda que a maior parte desses pacientes eram homens que faziam sexo com homens (HSH): 82,5% no estado do Rio de Janeiro, 95% na análise de casos de 16 países e 75% na série de casos dos EUA. A Mpox, nessa população, é mais frequente nos HSHs com maior número de parceiros e com parceiros desconhecidos. Acredita-se que a transmissão do vírus nesse contexto seja decorrente do contato íntimo e prolongado durante as relações sexuais e não por meio de secreções genitais, que caracterizariam transmissão sexual.

Considerando que a disseminação global da Mpox no surto atual pode estar associada a atividade sexual, outra população vulnerável nesse cenário são os profissionais do sexo, que, assim como os demais grupos vulneráveis, devem ser priorizados quanto ao acesso à informação e educação para prevenção e demais cuidados.

Nota:

É muito importante evitar a estigmatização dos HSHs, como vimos acontecer com a pandemia de HIV/Aids na década de 80 do século XX. A estigmatização, além de suas consequências sociais e humanas deletérias, pode implicar diagnóstico tardio ou mesmo ausência de diagnóstico, seja por receio de procurar serviços de saúde, seja por falta de suspeição diagnóstica em pessoas não HSH, perdendo-se a oportunidade de prevenir a transmissão por meio de isolamento.

Cabe ressaltar que a transmissão do MPXV se dá por contato íntimo e prolongado com um paciente com lesões e pode acontecer em diversas circunstâncias não ligadas ao ato sexual. Também precisamos considerar que há casos notificados em mulheres e crianças, embora em menor proporção.

Manifestações Clínicas do Mpox

A transmissão por contato direto com secreção das lesões cutâneas parece ser a mais frequente. Depois do contato, aparecem as lesões no local de inoculação. Na maior parte dos casos, elas surgem em região genital e anal após contato sexual, sem a ocorrência de período prodrômico com sintomas sistêmicos. Além disso, observam-se casos com poucas lesões localizadas, sem a distribuição centrífuga e com lesões simultâneas em diferentes fases evolutivas. A taxa de mortalidade descrita no surto atual varia de 3% a 6%.

Os sintomas sistêmicos mais frequentes são:

  • Febre, 
  • Letargia,
  • Mialgia 
  • Cefaleia 
  • Linfoadenopatia

O intervalo de tempo entre o primeiro contato com o vírus até o início dos sinais e sintomas da Mpox (período de incubação) é tipicamente de 3 a 16 dias, mas pode chegar a 21 dias. Após a manifestação de sintomas como erupções na pele, o período em que as crostas desaparecem, a pessoa doente deixa de transmitir o vírus a outras pessoas. As erupções na pele geralmente começam dentro de um a três dias após o início da febre, mas às vezes, podem aparecer antes da febre.

As lesões da pele podem levar a intenso prurido e o ato de coçar pode agravar as lesões da pele e auxiliar a contaminação por bactérias oportunistas. É relatado também a incidência de dor moderada a grave nas lesões apresentadas pela pessoa.

O aumento dos linfonodos submandibulares, cervicais e inguinais pode ser observado de um a dois dias após o início da erupção cutânea.

As complicações são decorrentes de infecção bacteriana secundária e da localização das lesões. A infecção bacteriana secundária da pele é bastante comum, observada em até um quinto dos pacientes, podendo evoluir para quadros mais graves, como pneumonia, encefalite e sepse, se não for identificada e tratada adequadamente

Confusão mental e convulsões são raras, mas também podem acontecer como consequência da encefalite viral.

Apesar de pouco frequentes, formas graves e óbito podem ocorrer, principalmente em pacientes com imunodepressão severa

A grande maioria dos pacientes que apresentaram lesões cutâneas no surto atual, estavam com alguma outra IST associada a infecção por Mpox. Pessoas vivendo com HIV estão mais supríveis a infecções mais graves pelo MPXV.

O Center for Disease Control and Prevention (CDC) dos EUA lançou, em janeiro de 2023, um alerta sobre Mpox em grávidas, relatando 23 casos, 3 dos quais próximos ao parto. Os bebês nasceram também com a doença, mas não houve casos graves.

Informações sobre Mpox em grávidas ainda são muito limitadas, mas deve-se pesquisar lesões genitais desde o pré-natal até o momento do parto, realizar exames específicos para os casos suspeitos e avaliar individualmente o uso de antivirais e a via de parto.

A Mpox deve ser diferenciada de outras infecções virais que também podem causar vesículas e pústulas, como Varicela, Herpes-Zoster e infecção pelo vírus do Herpes Simples. Outras infecções por poxvírus, como Molusco Contagioso, Estomatite Bovina e Ectima Contagioso ou Orf, também podem causar lesões cutâneas semelhantes à Mpox, bem como algumas infecções bacterianas e virais de pele, como impetigo, antraz cutâneo, sarampo, doença mão-pé-boca e outras 

A apresentação da Mpox como uma úlcera genital solitária tem sido bem documentada na literatura e precisa ser diferenciada de outras ISTs que causam úlceras genitais, como sífilis, cancroide, condiloma acuminado e gonorreia disseminada. Foi observada a coinfecção de Mpox com várias ISTs, e a evidência de uma ou mais ISTs não deve excluir o diagnóstico de infecção por Mpox.

Tratamento Clínico

Em casos suspeitos ou confirmados de mpox, a base do tratamento é o manejo sintomático. A terapia é focada no manejo da dor oral, genital e anorretal; na redução do prurido; no monitoramento da febre; no tratamento da proctite, se presente; e na limpeza das lesões de pele.

As opções de tratamento incluem enxágues anestésicos, anestésicos tópicos, banhos de assento ou de aveia, laxantes, analgésicos, anti-histamínicos orais ou tópicos ou outros géis ou loções não irritantes, como calamina ou mentol. 

De modo geral, a maioria dos pacientes se recupera apenas com o controle dos sintomas. Nos pacientes que desenvolvem dor intensa, são necessários regimes de tratamento multimodal, que podem incluir opioides.

Em caso de infecções bacterianas secundárias, deve-se introduzir antibioticoterapia apropriada.

Nota:

Vários antivirais podem ser prescritos para o tratamento de mpox. Alguns desses medicamentos foram aprovados para o tratamento da varíola com base em modelos animais e estudos de dose e segurança em humanos saudáveis, portanto espera-se que tenham a mesma atividade contra a mpox. Nesse momento, o Tecovirimat – TPOXX é o tratamento de escolha.

O Tecovirimat (também conhecido como TPOXX ou ST-246) é um novo medicamento antiviral estocado para preparação contra varíola. É aprovado pela FDA apenas para o tratamento de varíola em adultos e crianças, com base em dados de eficácia animal e dados de segurança em 359 adultos saudáveis.

O Tecovirimat ou TPOXX é um inibidor potente da proteína do vírus necessária para a formação de uma partícula viral infecciosa, sendo recomendado para casos em que há risco elevado de doença grave. Deve-se avaliar cada paciente quanto à elegibilidade para receber o antiviral. O TPOXX é recomendado para tratamento compassivo para pacientes com resultado laboratorial positivo/detectável para MPXV com lesão ocular e/ou internado com a forma grave da doença, apresentando uma ou mais das seguintes manifestações clínicas.

Apesar de esse medicamento não ter registro no Brasil, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), após solicitação do Ministério da Saúde (MS), autorizou, em caráter excepcional e temporário, a dispensa do registro do medicamento importado pelo Ministério, considerando a emergência em saúde pública.

A dose recomendada de TPOXX depende do peso do paciente. Por exemplo, para pacientes com peso ≥40 kg e <120 kg, a dose indicada é de 600 mg (três cápsulas) a cada 12 horas. A formulação intravenosa (IV) não deve ser usada em pacientes com insuficiência renal grave (depuração de creatinina <30mL/min) e deve ser usada com cautela em pacientes com doença renal moderada ou leve, bem como em crianças menores de dois anos de idade devido ao acúmulo do ingrediente hidroxipropil-beta-ciclodextrina na formulação IV.

A duração do tratamento é de 14 dias. No entanto, pacientes imunocomprometidos podem necessitar de um tratamento mais longo.

Se o TPOXX não estiver disponível, a decisão de tratar a doença com um agente alternativo, como o Cidofovir (ou Brincidofovir, se disponível), deve ser individualizada, pois o risco de complicações é maior quando esses agentes são utilizados (por exemplo, o risco de insuficiência renal e anormalidades eletrolíticas é maior). Contudo, esses medicamentos não possuem licença para uso no Brasil.

Vacinação contra Mpox

Com a erradicação da varíola no Brasil e no mundo, foi estabelecido no país que a vacinação contra a varíola não seria mais obrigatória. Desde então, o Brasil não tem reserva estratégica dos imunobiológicos mais antigos contra a varíola.

Assim, no atual surto de Mpox no Brasil e no mundo, iniciado em maio de 2022, o suprimento de vacinas mais recentes é limitado e as estratégias de acesso estão em discussão. Portanto, a OMS recomenda que a utilização das vacinas leve em consideração o atual cenário e as evidências.

Os orthopoxvirus têm alta similaridade entre si, portanto as vacinas produzidas com vírus Vaccinia geram imunidade contra a varíola humana e a Mpox. Os conhecimentos sobre a eficácia desses imunizantes contra a Mpox ainda são bastante restritos, por isso a OMS solicita que os países coletem e compartilhem dados sobre a eficácia das vacinas.

Atualmente, somente três vacinas (MVA-BN, ACAM2000 e LC16) estão disponíveis para uso no mundo, por demonstrarem eficácia para proteção cruzada contra o MPXV. Destaca-se que a vacinação em massa contra a Mpox não é recomendada pela OMS. A orientação da OMS é de que sejam adotadas estratégias robustas de vigilância e monitoramento dos casos e investigação e rastreamento de pessoas que tenham tido contato com a doença como principais medidas de prevenção da disseminação da doença.

Vacina MVA-BN

É uma vacina baseada em um Orthopoxvirus não replicante de terceira geração atenuado e vivo, o Vaccinia Ankara Modificado (MVA). A Food and Drug Administration (FDA), dos Estados Unidos da América (EUA), autorizou o uso emergencial dessa vacina nos EUA para prevenção da mpox em indivíduos com 18 anos ou mais de idade com elevado risco de infecção. Ela é administrada em duas doses, com quatro semanas de intervalo, por via subcutânea ou intradérmica e pode ser aplicada em indivíduos imunocomprometidos e gestantes. Fabricada pela empresa dinamarquesa Bavarian Nordic, recebe nomes diferentes de acordo com o local em que é distribuída, sendo chamada de Jynneos nos EUA, Imvamune no Canadá e Imvanex na União Europeia.

O Brasil adquiriu doses da MVA-BN em resposta ao surto de Mpox em 2022, com a distribuição focada em grupos específicos, como profissionais de saúde, pessoas expostas a casos confirmados e populações de risco elevado. A vacinação é geralmente recomendada para pessoas que tiveram contato próximo com alguém infectado, para quem trabalha diretamente com o vírus em laboratórios, ou para quem corre risco de exposição.

Vacina ACAM200

É uma vacina de segunda geração indicada para a prevenção da varíola. Foi autorizada para uso contra a varíola no surto atual por protocolo de Novo Medicamento Investigacional de Acesso Expandido (EA-IND), que requer consentimento do usuário. Fabricada pela Emergent BioSolutions, a vacina ACAM2000 contém um vírus Vaccinia vivo replicante.

A ACAM2000 tem algumas diferenças em relação à MVA-BN (Jynneos/Imvanex). A ACAM2000 é uma vacina de vírus vivo replicante, o que significa que o vírus da vacina pode se replicar no corpo, podendo causar efeitos colaterais mais graves em comparação com a MVA-BN, que utiliza um vírus modificado não replicante.

Devido ao perfil de segurança e aos efeitos colaterais potenciais, a MVA-BN é preferida em muitos casos para a prevenção da Mpox, especialmente em populações imunocomprometidas ou em situações em que o risco de efeitos adversos é elevado.

No Brasil, a estratégia de vacinação contra a Mpox tem se concentrado principalmente na aquisição e utilização da vacina MVA-BN. A ACAM2000 pode estar disponível em situações muito específicas, mas não é a principal vacina utilizada ou recomendada para a população geral contra a Mpox no país.

Vacina LC16 – KMB

É uma vacina liofilizada, de terceira geração, preparada em cultura de células LC16 “KMB”, aprovada para prevenção de varíola, e seu titular de autorização para comercialização é a KM Biologics Co., Ltd. do Japão.

Essa vacina tem sido usada principalmente no Japão e em alguns outros países asiáticos. Ela foi desenvolvida para ter um perfil de segurança melhorado em comparação com outras vacinas contra a varíola, como a ACAM2000, e é considerada segura para uso em indivíduos imunocomprometidos, embora ainda haja precauções necessárias.

No Brasil, a LC16-KMB não é amplamente utilizada.

A LC16-KMB não faz parte das estratégias de vacinação no Brasil, e sua disponibilidade é bastante limitada fora do Japão.

Portanto, embora a LC16-KMB seja uma vacina promissora, especialmente em termos de segurança, ela não é uma opção amplamente acessível ou utilizada no Brasil.

Crédito da imagem de capa do artigo: Instituto Oswaldo Cruz (IOC/Fiocruz)

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:

  • BRASIL. Ministério da Saúde. Mpox. Disponível em: https://www.gov.br/saude/pt-br/assuntos/saude-de-a-a-z/m/mpox. Acesso em: 21 ago. 2024.
  • CDC – U.S. CENTERS FOR DISEASE CONTROL AND PREVENTION. Mpox 2022-2023 Mpox Outbreak Global Map. Disponível em: https://www.cdc.gov/poxvirus/mpox/response/2022/world-map.html Acesso em: 21 ago. 2024.
  • WORLD HEALTH ORGANIZATION. WHO recommends new name for monkeypox disease. 28 nov. 2022. Disponível em: https://www.who.int/news/item/28-11-2022-who-recommends-new-name-for-monkeypox-disease. Acesso em: 19 ago. 2024.
  • KUMAR, N. et al. The 2022 outbreak and the pathobiology of the monkeypox virus. J. Autoimmun., v. 131, jul. 2022. DOI: 10.1016/j.jaut.2022.102855.
  • LUNA, N. et al. Phylogenomic analysis of the monkeypox virus (MPXV) 2022 outbreak: Emergence of a novel viral lineage? Travel Medicine and Infectious Disease, v. 49, set. 2022. DOI: 10.1016/j.tmaid.2022.102402.
  • PATRONO, L. V. et al. Monkeypox virus emergence in wild chimpanzees reveals distinct clinical outcomes and viral diversity. Nat Microbiol. v. 5, 2020. https://doi.org/10.1038/s41564-020-0706-0.
  • THORNHILL, J. P. et al. Monkeypox Virus Infection in Humans across 16 Countries. New England Journal of Medicine, v. 387, p. 679-691, jul. 2022.
  • CLARO, I. M. et.al. Shotgun metagenomic sequencing of the first case of monkeypox virus in Brazil, 2022. Rev Inst Med Trop São Paulo. v. 64, dez. 2022. DOI: 10.1590/S1678-9946202264048 
  • FENNER, F. et al. Human Monkeypox and Other Poxvirus Infection of Man. In: FENNER, F. et al. Smallpox and its Erradication. Geneva: World Heathy Organization, 1988. p. 1287-1319.
  • HAPPI, C. et al. Urgent need for a non-discriminatory and non-stigma – tizing nomenclature for monkeypox virus. 2022. Disponível em: https:// virological.org/t/urgent-need-for-a – -non-discriminatory-and-non-stigma – tizing-nomenclature-for-monkeypox – -virus/853. Acesso em: 19 ago. 2024.
  • BRASIL. Ministério da Saúde. Plano de Contingência Nacional para Monkeypox. Centro de Operações de Emergência em Saúde Pública: COE Monkeypox. Versão 2, 2022. Brasília, 2022.
  • WORLD HEALTH ORGANIZATION. Vaccines and immunization for monkeypox, Interin guidance. 16 Nov. 2022. Disponível em: https://www.who.int/publications/i/item/WHO-MPX-Immunization. Acesso em: 19 ago. 2024.
  • FERNANDES, Tania. The smallpox vaccine: its first century in Brazil (from the Jennerian to the animal vaccine). Hist. Cien. Saude-Manguinhos., vol. 6, n. 1, Jun. 1999. Disponível em: https://www.scielo.br/j/hcsm/a/ync9ZfnBHqqjgrMGpMGYj3m/?lang=pt#. Acesso em: 19 ago. 2024.
  • FRENOIS-VEYRAT, G. et al. Tecovirimat is effective against human monkeypox virus in vitro at nanomolar concentrations. Nature Microbiology, v. 7, n. 12, p. 1951-1955, dez. 2022.
  • TORRES, H. M. et al. Approaching monkeypox: a guide for clinicians. Top Antivir Med. 2022 Oct;30(4):575-581. PMID: 36375131; PMCID: PMC9681140.
  • RAMNARAYAN, P., et al. Neonatal monkeypox virus infection. N Engl J Med. DOI: 10.1056/NEJMc2210828 SILVA, M.S.T. et al. Ambulatory and hospitalized patients with suspected and confirmed mpox: An observational cohort study from Brazil. The Lancet Regional Health – Americas 2022;▪: 100406. Published Online XXX. https://doi.org/10. 1016/j.lana.2022. 100406 THORNHILL, J. P. et al. Monkeypox Virus Infection in Humans across 16 Countries — April–June 2022. New England Journal of Medicine, v. 387, n. 8, p. 679–691, 25 ago. 2022.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *