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Estudos sobre efeitos das queimadas para a saúde humana são escassos, tanto no Brasil quanto no exterior, em que pese quase toda a literatura que trata das emissões atmosféricas produzidas por queima de biomassa mencionar que elas causam efeitos deletérios à saúde.
Um aspecto relevante a se ressaltar é que as queimadas não são homogêneas, assim como seus efeitos para a saúde. Diferentes tipos de biomassa apresentam emissões bastante variadas em termos de gases e de material particulado. Diferentes fases ou estágios das queimadas também apresentam estas variações
Assim, a queima de cerrado ou de floresta amazônica apresenta disparidades em termos de emissões. Experiências realizadas no Brasil indicaram que enquanto a queima de cerrado apresentava um padrão bem definido de emissão, dependendo da fase de combustão e da categoria de cerrado, os resultados da floresta tropical foram mais difíceis de interpretar uma vez que não apresentavam uma estrutura relacionada à fase de combustão nem ao tipo de floresta (primária ou secundária).
A exposição à poluição do ar contribui para morbimortalidade a curto (horas a semanas) e a longo prazo (anos), reduzindo a expectativa de vida. Existem populações ainda mais suscetíveis aos efeitos da poluição do ar, como pessoas com comorbidades, idosos, crianças e gestantes.
A estimativa da Organização Mundial da Saúde (OMS) é de que cerca de 7-9 milhões de mortes prematuras são atribuídas à poluição do ar a cada ano no mundo, sendo cerca de 3 milhões de poluição intradomiciliar e 4 milhões de poluição ambiental. O principal poluente com repercussão clínica é o Material Particulado fino (MP 2,) – que consiste em uma mistura complexa de compostos orgânicos e inorgânicos que estão em estado líquido ou sólido invisíveis em suspensão, ou seja, no ar. Os principais gases que têm relevância para a saúde são: O3 (ozônio troposférico) NOx (Óxidos de Nitrogênio), SO² (Dióxido de Enxofre) e o CO (Monóxido de Carbono).
A literatura especializada indica que os principais efeitos à saúde humana da poluição atmosférica são problemas oftálmicos, doenças dermatológicas, gastrointestinais, cardiovasculares e pulmonares, além de alguns tipos de câncer. Efeitos sobre o sistema nervoso também podem ocorrer após exposição a altos níveis de monóxido de carbono no ar. Além disso, efeitos indiretos podem ser apontados em decorrência de alterações climáticas provocadas pela poluição do ar. Um aumento na temperatura do ar tem impactos na distribuição da flora e da fauna e, consequentemente, influencia a distribuição de doenças transmitidas por vetores.
A exposição aguda (curto prazo) a altos níveis do MP fino pode representar sérios problemas de saúde temporários, como irritação ocular; doenças pulmonares e cardiovasculares, como infarto agudo do miocárdio e acidente vascular cerebral; além de morte prematura. A exposição crônica (a longo prazo) pode levar a problemas de saúde, como câncer, morte e danos aos sistemas imunológico, neurológico, endocrinológico, reprodutivo e respiratório do corpo
Os indivíduos mais suscetíveis aos efeitos da poluição do ar são:
- Pessoas com comorbidades pré-estabelecidas (ex.: doenças cardiovasculares, doenças respiratórias, diabetes e obesidade);
- Idosos;
- Crianças (devido ao risco de pneumonia, asma e efeitos neuropsicológicos – TDAH, autismo, desempenho escolar e memória);
- Gestantes (pode levar ao baixo peso fetal);
- Recém-nascidos por estarem mais suscetíveis a infecções e inflamações.
- Pessoas em situação de vulnerabilidade social (maior chance de estarem mais expostas à poluição do ar, como queima de lixo, moradia próximo a tráfego intenso/com poeira ressuspensa ou uso de lenha ou outros materiais para se aquecer, cozinhar ou iluminar);
- Pessoas em profissões com riscos ocupacionais, como motoristas, pessoas que trabalham em usinas de carvão e pessoas que trabalham com queima de biomassa, como canaviais ou roças, dentre outras profissões que envolvam a queima de materiais
A exposição a altos níveis de fumaça no ar pode causar vários problemas de saúde, incluindo:
- Doenças respiratórias, como asma, enfisema, bronquite, sinusite e rinite
- Infecções do sistema respiratório superior
- Irritação dos olhos e garganta
- Tosse
- Falta de ar
- Congestionamento nasal
- Vermelhidão e alergia na pele
- Desordens cardiovasculares
- Acidentes vasculares cerebrais
- Doenças cardíacas
- Câncer de pulmão
- Doenças pulmonares obstrutivas crônicas
- Conjuntivites
Fonte: TelessaúdeRS-UFRGS (2023), adaptado de European Environment Agency (2023) [12].
Nota: Partículas com diâmetro igual ou inferior a 2,5 μg (PM2,5), partículas com diâmetro igual ou inferior a 10 μg (PM10), ozônio (O3), dióxido de nitrogênio (NO2), benzo[a]pireno (BaP) e dióxido de enxofre (SO2).
Entre as recomendações do Ministério da Saúde estão o aumento da ingestão de água e de líquidos, como medida para manter as membranas respiratórias úmidas e, dessa forma, ficarem mais protegidas. O tempo de exposição deve ser reduzido ao máximo, devendo manter a permanência em local ventilado dentro de casa, se possível com ar-condicionado ou purificadores de ar. Para reduzir a entrada da poluição externa, durante os horários com elevadas concentrações de partículas, as portas e as janelas devem ser mantidas fechadas. As atividades físicas devem ser evitadas em horários de elevadas concentrações de poluentes do ar, e entre o meio-dia e as 16h, quando as concentrações de ozônio são mais intensas.
Em nota, pelo Ministério da Saúde, ficou recomendado:
- Aumentar a ingestão de água e líquidos ajuda a manter as membranas respiratórias úmidas e, assim, mais protegidas;
- Reduzir ao máximo o tempo de exposição, recomendando-se que se permaneça dentro de casa, em local ventilado, com ar-condicionado ou purificadores de ar;
- As portas e as janelas devem permanecer fechadas durante os horários com elevadas concentrações de partículas, para reduzir a penetração da poluição externa;
- Evitar atividades físicas em horários de elevadas concentrações de poluentes do ar, e entre 12 e 16 horas, quando as concentrações de ozônio são mais elevadas;
- Uso de máscaras do tipo “cirúrgica”, pano, lenços ou bandanas podem reduzir a exposição às partículas grossas, especialmente para populações que residem próximas à fonte de emissão (focos de queimadas) e, portanto, melhoram o desconforto das vias aéreas superiores. Enquanto o uso de máscaras de modelos respiradores tipo N95, PFF2 ou P100 são adequadas para reduzir a inalação de partículas finas por toda a população;
- Crianças menores de 5 anos, idosos maiores de 60 anos e gestantes devem redobrar a atenção para as recomendações descritas acima para a população em geral. Além disso, devem estar atentas a sintomas respiratórios ou outras ocorrências de saúde e buscar atendimento médico o mais rapidamente possível.
Pessoas com problemas cardíacos, respiratórios, imunológicos, entre outros, devem:
- Buscar atendimento médico para atualizar seu plano de tratamento;
- Manter medicamentos e itens prescritos pelo profissional médico disponíveis para o caso de crises agudas;
- Buscar atendimento médico na ocorrência de sintomas de crises;
- Avaliar a necessidade e segurança de sair temporariamente da área impactada pela sazonalidade das queimadas.
imagem da capa : TelessaúdeRS-UFRGS (2023), adaptado de European Environment Agency (2023) [12].
REFERÊNCIAS:
- MINISTÉRIO DA SAÚDE. Nota à imprensa: orientações para evitar a exposição à fumaça intensa e neblina, causadas por queimadas. Ministério da Saúde apresenta orientações à população sobre como se proteger. Publicado em 25 ago. 2024. Disponível em: https://www.gov.br/saude/pt-br/canais-de-atendimento/sala-de-imprensa/notas-a-imprensa/2024/orientacoes-para-evitar-a-exposicao-a-fumaca-intensa-e-neblina-causadas-por-queimadas. Acesso em: 26 ago. 2024.
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